sexta-feira, 3 de outubro de 2008

MATTANA: TEATRO COM O CORPO E A ALMA


(Márcio Mattana en cena de Recreio Pingue-pongue -

Foto de Ale Haro)



Márcio Mattana (43) está entre os grandes nomes do teatro curitibano, pudera, é um dos profissionais mais respeitados no meio teatral da cidade. Tive o prazer de entrevistá-lo num bate papo que durou cerca uma hora e meia em minha casa. A entrevista, que me valeu como uma aula de história do teatro paranaense, me foi concedida na véspera do seu aniversário e que, por isso, acredito eu, lhe caiu como uma retrospectiva de toda a sua carreira.
Mattana, como é conhecido no meio, parece, de tão apaixonado pela profissão, respirar teatro. Quando fala, há certo brilho no olhar que somente os apaixonados refletem. É empolgado e, ao mesmo tempo, concentrado.
Entre todas as funções que já exerceu dentro do teatro, é hoje também professor de interpretação e direção na Faculdade de Artes do Paraná – FAP, oficio que concilia harmoniosamente com seu trabalho de ator e diretor teatral. Como toda pessoa que cultiva cada capítulo de sua história, Mattana tem muitas lembranças e curiosidades para nos contar.

Carreira

Antes de 1984, quando iniciou a faculdade de Letras em Cascavel, interior do Paraná, Márcio Mattana não imaginava os novos rumos que sua carreira tomaria. Estimulado por uma grande amiga, atriz amadora, Márcio começou a fazer parte de um grupo local e assim permaneceu atuando até 1988, época em que o movimento teatral no interior era bastante intenso. Foi nesse mesmo ano que o ex-bancário, trancou a faculdade de Letras no terceiro ano e já estava de malas prontas para vir a Curitiba prestar o vestibular da faculdade de teatro, antiga PUC e hoje FAP. E então, a partir de 1989, o jovem ator, já apaixonado, nunca mais conseguiu viver sem o famoso “friozinho na barriga”, comum a todos antes de entrar em cena. Formou em Artes Cênicas em 1992.
Como ator, já participou em mais de trinta espetáculos e tem no seu currículo vários nomes de diretores como Enéas Lour, Luthero de Almeida, Edson Bueno, Marcelo Marchioro, Ademar Guerra e Felipe Hirsch, entre outros.
Como diretor, já assinou mais de vinte espetáculos e também trabalhou como diretor de palco em São Paulo de importantes montagens de Felipe Hirsch, como Os solitários, produzida e protagonizada por Marco Nanini e Marieta Severo em 2002. Em Curitiba já revelou vários atores, atrizes e técnicos do teatro local.
Como educador, desde 2003, vem quebrando antigas posturas acadêmicas e se destacando como um dos professores mais comprometidos e admirados pelos alunos da FAP. Márcio diz que sua aptidão com a educação vem dos tempos do antigo ginásio, onde já ministrava aulas particulares para os colegas de turma que apresentavam dificuldades no desempenho curricular. Quanto à admiração dos alunos da faculdade de teatro, acredito que seu talento deve-se principalmente pela competência que tem em dirigir atores e, dessa forma, acertar na metodologia que desenvolveu ao longo de todos os anos da prática teatral.

O artista, o teatro e o público.

O DESPERTAR DA PRIMAVERA, de Frank Wedekind (1998-1999). Direção de Márcio Mattana. fotografia: Roberto Reittenbach (divulgação).



Márcio Mattana vê o teatro que é feito hoje em Curitiba sob dois prismas. O primeiro é sob seu olhar otimista em acreditar que a produção local está em um bom caminho, “anos atrás era muito mais difícil produzir teatro em Curitiba devido à baixa verba destinada aos produtores locais. (...) Ainda não tínhamos os editais de produção e circulação e nem as leis de benefício à cultura, ganhos que dissolveram as panelinhas”, completa. Por outro lado, acredita que o formato atual das leis de incentivo valoriza as produções rápidas e de pouco tempo em cartaz, “porque os atores precisam trabalhar e, portanto, devem estar em pelo menos quatro editais por ano para ganhar um salário mensal”, explica Mattana. Apesar dos devidos ajustes necessários, Márcio Mattana vê os rumos promissores da produção cultural, como, por exemplo, o financiamento da pesquisa de grupo e, por ser um artista politizado, sabe avaliar de forma bastante madura a política cultural do país.
No seu trabalho, tem como principal objetivo o público. É sobretudo com o público que seu trabalho dialoga. Não está interessado em desenvolver nenhum discurso hermético. Quer se comunicar com a platéia. Acredito que sobre esse aspecto quem mais ganha somos nós, artistas e publico. Os artistas porque terão as salas de espetáculo lotadas nos dias de apresentação e o público porque sempre voltará ao teatro.
Nesse sentido é que Márcio Mattana lança seu olhar pessimista sobre uma parcela do teatro que tem sido produzido nos dias de hoje,ou seja, “quando ainda não tínhamos as leis de incentivo, o responsável por setenta por cento dos lucros de uma produção vinha da bilheteria e isso quer dizer que o público ia muito mais ao teatro”, lembra ele. O pessimismo disso tudo é apenas enxergar que existem profissionais produzindo espetáculos descartáveis com o dinheiro público. Márcio é ético, não cita nomes, porém registra a provocação.


Novos Rumos

Para o próximo ano, Mattana já tem pelo menos três projetos fechados. Um deles é a estréia da Companhia de Repertório, companhia teatral que será lançada na cena curitibana com a direção dele para o espetáculo Pessoas comuns não dizem bom dia. Aguardamos ansiosos.
Quando, para encerrar a entrevista, pergunto a ele que se eu fosse um poderoso investidor da cultura e oferecesse a quantia necessária para produzir qualquer espetáculo, quem seriam o autor, o ator e a atriz escolhidos, ele arquitetonicamente, depois de muito pensar, responde: “bem, quanto ao ator e a atriz queria que fossem de Curitiba, então escolheria Fernanda Magnani por ser uma excelente atriz, bastante jovem e ainda desconhecida. Para contracenar com ela, convidaria um ator mais velho e bastante experiente, Luthero de Almeida. Adoraria dirigir esses dois numa adaptação do clássico Solness, O construtor de Ibsen. Mostraria o fim de uma era, através de um grande e experiente ator fazendo um construtor, e o início de outra era pelo trabalho de uma grande, porém jovem atriz interpretando uma aprendiz”.
Salve os escolhidos! Eu com certeza estaria na platéia na noite de estréia.

MODA E ARTE

(Desfile de Ronaldo Fraga)


Um dos elementos que mais me chamam a atenção na campanha de uma marca de roupa é o conceito desenvolvido pelo designer (ou estilista) na criação de uma coleção.



Os mínimos detalhes, tudo, desde a cartela de cores à ambientação de passarela no lançamento da coleção é estrategicamente pensado para que o conceito-tema seja criativamente decodificado pelo consumidor. Ler as entrelinhas da moda é uma aventura bastante prazerosa.



A moda atualmente está intimamente relacionada com diversas linguagens artísticas. Falar de moda é também falar de cinema, de música, de teatro e, sobretudo, de artes visuais. Nesse sentido, podemos considerar cada estação não apenas como um lançamento de coleção, mas como criação e desenvolvimento híbrido de um evento cultural. As artes visuais, sobretudo, estão para a moda assim como o corpo está para a roupa.



O desenvolvimento de um produto está intimamente ligado a atitude de quem vai comprá-lo. Dessa forma, cada look composto para um desfile, cada perfil de uma modelo escolhida, cada trilha sonora, cada cenário criado, tudo, absolutamente tudo deve dialogar com o conceito desenvolvido pela coleção. A linguagem visual da moda nos permite transitar pelos corredores de uma época, de um fato histórico, de uma personagem, de uma personalidade ou até mesmo de uma estória criada pela imaginação de um criador de moda.


RONALDO FRAGA, UM CRIADOR DE MODA.


O estilista mineiro Ronaldo Fraga está no hall dos criadores mais criativos do País. Gosto muito dos conceitos e criações desenvolvidos por ele a cada coleção. Ronaldo soma às criações o conforto das peças e um estilo próprio que transita do mais simples corte a mais elaborada modelagem e composição. Sua estética é também, ao meu ver, bastante teatral.
Sua marca surgiu em 1996 e de lá para cá vem ganhando muitos adeptos e consumidores. Seu universo é composto sempre por muita ousadia, bom humor, cores e texturas que valorizam uma sensualidade inocente que sempre está na contramão das tendências da moda.

Cria os figurinos da banda Pato Fu e da companhia de dança Grupo Corpo, referências nacionais da música e da dança. É dono de duas lojas no Brasil, uma em Belo Horizonte e outra em São Paulo, além de ter sua marca revendida em vários representantes no Brasil e exterior.
É um colorista genial, compõe cores que juntas impõem um discurso provocativo, elemento que está sempre presente nas estórias que nos apresenta a cada lançamento de coleção. A impressão que tenho é que qualquer nova informação, seja ela proveniente de qualquer área, pode ser utilizada por Ronaldo Fraga como um potente material criativo para o seu repertório.
As referências, apresentadas nas suas roupas, sempre são muito diversas das apresentadas na coleção passada. O teatro, a música, as artes visuais e o cinema dialogam harmoniosamente com o seu mercado da moda, sem apresentar soluções fáceis na hora de tornar sua arte em produto. É um comunicador brilhante.

Quem quiser conhecer melhor o trabalho desse talentoso estilista e se aventurar por histórias, que de tão românticas nos fazem esquecer da industrialização que impregnou o mercado da moda desde a segunda década do século vinte, deve fazer uma visita atenta ao seu site: http://www.ronaldofraga.com.br/. É uma deliciosa viagem.